Cerca de 12 milhões de mulheres superaram extrema pobreza
A vida da cearense Angeline Freire de Souza começou a mudar quando ela se tornou beneficiária do Bolsa Família, dez anos atrás. Ela atribui ao programa a chance de superar uma situação de violência doméstica, a oportunidade de criar os filhos, trabalhar, voltar aos estudos e pensar no futuro. Entrar para o programa significou, para ela, passar de condição de vítima à de guerreira: “Eu não quero ser chamada de coitadinha, a pobrezinha ou me sujeitar a qualquer tipo de violência. Quero ser vista como uma pessoa que conseguiu superar tudo, que é guerreira, que vai atrás, que é determinada”, afirma. A história de Angeline não é um caso isolado.
Das 22 milhões de pessoas que superaram a pobreza extrema nos últimos quatro anos, 12 milhões são do sexo feminino. Mães com crianças pequenas representavam a face mais dramática da pobreza no país. As mulheres puderam contar com a complementação de renda do Bolsa Família e, sobretudo, com melhores condições de saúde e educação para seus filhos, além de oportunidades de inclusão produtiva. Aos 38 anos, Angeline entrou recentemente para a Universidade Federal do Ceará e acredita que, em breve, poderá deixar a condição de beneficiária do programa de transferência de renda, da qual se orgulha.
“Quando comecei a receber o benefício, pensei que não precisaria mais travar uma luta pelo dinheiro dele [o ex-companheiro] para ajudar meus filhos”, conta. “Assim que acaba o dinheiro, tenho o benefício para me ajudar. Esse complemento veio suprir uma necessidade, principalmente de alimentação”, completa. Mãe de quatro filhos, Angeline trabalha no Banco Comunitário Palmas, na periferia de Fortaleza (CE). Ela está no terceiro semestre do curso de Pedagogia e faz planos para o futuro.
“Quero trabalhar com escolas que fazem parte da minha realidade. Quero ajudar essas crianças e melhorar a educação delas. Tenho a certeza de que vou ensinar na periferia.” Em 93% das 14 milhões de famílias que recebem a transferência de renda, as mulheres são as responsáveis pela retirada do dinheiro. Dessas, 68% são mulheres negras. “As mulheres são nossas parceiras no Bolsa Família. Elas tiveram mais autonomia econômica para gerir os recursos da casa e pensam em primeiro lugar no bem-estar dos filhos”, destaca a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello.
A história de Xica da Silva: "Nós, mulheres, podemos fazer muito mais"
O Dia Internacional da Mulher, comemorado neste domingo (8), reforça a importância da articulação de políticas públicas para que as mulheres conquistem mais qualificação profissional e espaço no mundo do trabalho, seja por meio do trabalho assalariado, autônomo ou associado.
Hoje, elas representam 67% das mais de 1,7 milhão de vagas do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), na modalidade voltada à população mais pobre. Com a qualificação, as mulheres ocupam postos que, anteriormente, eram exclusivamente masculinos, como a construção civil. Depois de incluídas profissionalmente, elas também empreendem e geram oportunidades.
Foi assim que Francisca Maria da Silva, 50 anos, enfrentou as marcas da violência doméstica, sofrida por 10 anos. A superação começou em 2001, após a nona denúncia contra o ex-companheiro. Com as marcas das agressões no corpo, Francisca conseguiu ajuda na Coordenadoria do Direito da Mulher de Belo Horizonte (MG). Lá, ela foi encaminhada para um abrigo e teve apoio psicológico e jurídico.
Em 2003, Francisca conheceu outras cinco mulheres com histórias semelhantes e teve acesso a informações sobre economia solidária. A partir daí, elas formaram o grupo Trem Bom para produzir pães, doces e bolos. “Entramos nesse negócio para ter renda e ocupação”, lembra a ex-beneficiária do Bolsa Família. “O benefício foi fundamental para eu ter uma retomada, para pegar minha vida de volta pela mão”, ressalta Francisca. Como o negócio estava dando certo, elas montaram o buffet Amigos de Xica, registrado em 2007 quando Francisca da Silva também deixou o Bolsa Família.
Batalhadora, Xica, como gosta de ser chamada, ainda administra a Rede de Alimentação Sabor Mineiro Uai – com oito empreendimentos exclusivos de mulheres com histórias parecidas. Sobre a renda atual, ela diz, sorrindo: “Dá para suprir as necessidades, só não está dando ainda para ir às Bahamas ou Las Vegas”. “Consegui sair da violência, cuidei das minhas três filhas. Elas concluíram o ensino médio e já fizeram curso técnico”, conta.
“Minha vida pessoal mudou muito, minha autoestima também, me sinto empoderada. Eu não olhava no espelho, pois sempre tinha o olhar para baixo. Agora me arrumo toda. É uma valorização pessoal, além da renda”, completa. Hoje, ela também dá palestras sobre o seu exemplo de superação de vida após a violência. “Depois do projeto de economia solidária, consegui tirar todo o rancor e a tristeza que tinha. Digo sempre que nós, mulheres, podemos fazer muito mais.”
Em todo o país, mais de 11 mil projetos semelhantes ao de Xica da Silva beneficiam 241 mil pessoas. Não é só na economia solidária que as mulheres estão conquistando espaço. Nas operações de crédito do Programa Crescer, que oferece microcrédito produtivo orientado a taxas reduzidas, 73% das operações de crédito do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal foram feitas por mulheres. Entre os microempreendedores individuais que fazem parte do Cadastro Único, as mulheres são responsáveis por mais da metade das formalizações.
Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome