Aplicativo que oferece faxinas a preços baixos pode ser acionado pelo MPT
A humilhação que o ministro da Economia do governo de Jair Bolsonaro, o banqueiro Paulo Guedes, fez às domésticas, ao afirmar que o dólar “barato” virou uma farra, para que elas pudessem passar férias na Disney (EUA), não constrangeu empresários que cada vez mais buscam burlar a legislação para oferecer mão de obra doméstica mais barata.
Esta semana, as redes sociais repercutiram negativamente o anúncio do aplicativo “Parafuzo”, que oferece ao cliente uma faxina ao preço de R$ 19,90, com a desculpa de que o valor cobrado é por uma hora e meia de trabalho e que uma segunda faxina custaria ao cliente R$ 39,00.
O titular da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes Trabalhistas (Conafret), do Ministério Público do Trabalho (MPT), promotor Tadeu Henrique Lopes da Cunha, explica que, do ponto de vista de valor, o aplicativo não comete, a princípio, uma irregularidade, já que os responsáveis por ele, afirmaram, após muitos questionamentos nas redes sociais, que, na verdade, os R$ 19,90 correspondem a uma hora e meia de trabalho, mas que a trabalhadora recebe R$ 39,00. Numa segunda faxina, o usuário do aplicativo pagaria os R$ 39,00 e a trabalhadora receberia R$ 31,00. Com isso, o aplicativo ficaria com a diferença (R$ 8,00).
Segundo o procurador do MPT, ao avaliar única e exclusivamente a questão salarial, a empresa não comete irregularidades, já que a hora trabalhada sobre um salário mínimo (R$ 1.045,00) por cinco dias da semana mais 4 horas no sábado equivale a quase R$ 5,00. Em tese, ela ganharia proporcionalmente mais do que uma trabalhadora doméstica com todos os seus direitos.
No entanto, a precarização das relações do trabalho vai ser analisada pelo MPT, para verificar se há irregularidades e motivos para entrar com uma ação contra o aplicativo, por falta de vínculo empregatício.
“Me parece uma precarização das relações do trabalho, com a falta de vínculo empregatício. Uma empregada tem uma série de direitos, a partir de uma legislação de 2015 e ela não pode ter esses direitos negados”, afirma o procurador .
Para que a falta desse vínculo seja comprovada é necessária uma investigação mais profunda porque o site do “Parafuzo” não traz a localização de sua sede, e segundo o promotor, é preciso saber qual a origem da empresa e dos trabalhadores cadastrados para determinar o local de uma possível ação.
“Vamos investigar e avaliar se é possível abrir uma ação contra o aplicativo”, afirma o procurador do MPT.
A “uberização” das relações de trabalho
Este tipo de precarização das relações do trabalho, por meio de aplicativos como Uber, IFood e LOG, entre outros, pode ser também colocada na conta da reforma Trabalhista, promovida no governo golpista de Michel Temer (MDB-SP), que retirou mais de 100 itens de direitos dos trabalhadores da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A promessa à época da aprovação da reforma Trabalhista era a geração de 6 milhões de empregos, mas o que se vê é o aumento da informalidade. Hoje quase 39 milhões de brasileiros (41,1% da mão de obra economicamente ativa) sobrevivem de bicos e ainda são chamados de “empreendedores”. Outros 11,6 milhões estão desempregados.
“A uberização das relações de trabalho está se expandindo para diversas profissões e, por isso o MPT está olhando esses tipos de contratações com muito cuidado, e estruturando um projeto para alinhar as ideias e estratégias de investigação a fim de uniformizar nossas ações, porque houve vitórias contra a LOG, que está em fase de recurso da empresa, mas a ação contra o IFood foi considerada improcedente”, conta o procurador do MPT.
Já o secretário nacional de Relações do Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento, diz que o aplicativo da faxina nada mais é do que um eco à voz dos últimos governos que veem a classe trabalhadora como mão de obra escrava. Para ele, o governo golpista de Temer ao fazer a reforma Trabalhista permitiu a precarização das relações de trabalho, enquanto o governo Bolsonaro aprofunda a precarização, retira ainda mais direitos e como se não bastasse, é misógino e ataca as mulheres.
“Desde o golpe de 2016 , que derrubou a ex-presidenta Dilma, vemos deteriorar as relações de trabalho. Não temos mais regramentos que protejam o trabalhador. Aqui empresário tem a desfaçatez de sugerir que o trabalhador possa comer com uma mão e operar uma máquina com a outra. Isto é apologia ao trabalho escravo. É esculhambar a classe trabalhadora”, diz Ari Ariolaldo, ao se referir ao empresário Benjamin Steinbruch, que em entrevista à imprensa disse: “Você vai nos Estados Unidos, vê o cara almoçando, comendo sanduíche com a mão esquerda, e operando a máquina com a mão direita. Tem 15 minutos para o almoço, entendeu?”
Trabalho doméstico é feito por 6 milhões de brasileiros e brasileiras
O trabalho doméstico é realizado por mais de 6 milhões de brasileiros e brasileiras. E, apesar da PEC das Domésticas, cujo objetivo é formalizar o trabalho da classe, 70% ainda estão em situação de informalidade, segundo levantamento de 2019 da Revista Exame. Já uma pesquisa de 2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que entre as domésticas dois terços são negras.
Fonte: CUT Brasil