“Nosso maior desafio é voltar para base, para os bairros”, defende o secretário-geral do STIMMMESL
Atualmente, devido à pandemia, o departamento de saúde do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos e São Leopoldo e Região (STIMMMESL), que conta com atendimento médico e odontológico, realiza 10 consultas por dia. Antes da covid-19, a média era de 25 atendimentos diários. O serviço prestado pela entidade é referência na região e o responsável pelo setor é o secretário-geral do STIMMMESL, Valdemir Ferreira Pereira.
“O Sindicato é importante por isso, além de fiscalizar, ele vai ajudar o trabalhador, acompanhar esse momento de não saúde dele. A gente faz esse papel de ajudar, acompanhar e fiscalizar”, conta o trabalhador da Gerdau desde 1991, na entrevista de sexta de hoje (1º). Ele lembra ainda que ainda na adolescência soube que estaria ao lado dos trabalhadores e oprimidos e, hoje, acredita que o maior desafio do movimento sindical é voltar para a base, para os bairros.
Confira a entrevista:
Conte um pouco da sua história? Como entrou no movimento sindical?
Então, com 15 anos de idade já tinha aquela visão da importância do movimento social, em plena ditadura militar. Mas era bastante receoso, assustado com aquela repressão toda. Porém já tinha bastante apreço pela história e sentia que precisávamos de liberdade para lutar contra aquilo, era o começo… Na verdade, tinha vontade de me expressar, mas era receoso. Depois as coisas mudaram e saímos da ditadura, continuava com essa ideia de ter lado, que seria dos oprimidos e dos trabalhadores. Fui servir o quartel e vi que ali era opressão mesmo, era lavagem de mente e eu não quis ficar. Comecei a trabalhar na metalúrgica Springer (hoje Midea), em Canoas, fui cipeiro por dois mandatos. Após entrei na Gerdau, onde também da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) por três mandatos. Então me convidaram, devido aos movimentos que fazíamos lá dentro, e 2007 eu me posicionei como sindicalista, fiz cursos e tal e em 2012 entrei para a chapa que ganhou a direção.
Você é responsável pelo setor de saúde aqui do STIMMMESL. Fale um pouco sobre isso?
O setor de saúde é fundamental na questão assistencial que temos aqui mais para as médias e pequenas empresas que não tem plano de saúde ou setor médico dentro da empresa e ficam desguarnecidas. Quando há algum sinistro, acidente, em vez de correr direto para algum posto, o que fica difícil, e mais fácil vir até aqui. O nosso trabalho, a importância de ter uma assistência dessas é neste caso de atender os trabalhadores das médias e pequenas empresas que não tem plano de saúde.
Qual a importância de os sindicatos pensarem a saúde do trabalhador?
Nem toda a empresa dá essa atenção especial quando o trabalhador está com sintoma de alguma doença ou LER/DORT (Lesões por Esforços Repetitivos e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), então o que acontece, o Sindicato é importante por isso, além de fiscalizar, ele vai ajudar o trabalhador, acompanhar esse momento de não saúde dele. A gente faz esse papel de ajudar, acompanhar e fiscalizar
Na tua opinião, com os serviços na área da saúde, os sindicatos acabam fazendo o papel do estado?
Sim, uma pequena parcela. Porque num universo de milhares de trabalhadores atendemos os associados, mas sem dúvidas a gente desafoga o posto de saúde lá na ponta. Essa é a parcela de contribuição, o que deveria ser de responsabilidade da empresa. O Sindicato faz esse papel e em contrapartida consegue ajudar também na questão da saúde pública.
Qual a tua avaliação dos ataques que a classe trabalhadora tem sofrido desde o golpe de 2016. Como as reformas trabalhistas e da previdência?
Para nós, estava muito evidente que o golpe era contra os trabalhadores, mas passar essa informação, fazer os trabalhadores entenderem é complicado… Na verdade vivemos um ciclo. Houve um momento que conseguimos alavancar nas conquistas e agora o capital se fortalece e quer buscar de volta tudo o que conquistamos. Isso ficou muito evidente, quando planejaram o golpe contra os trabalhadores para retirar os direitos que foram conquistados com muita luta. Vejo dessa forma e teremos que lutar para não perder mais direitos.
O movimento sindical, como um todo, está muito desacreditado. Como reverter isso?
Na minha visão, nós do movimento sindical e social que surge na periferia, nos anos 80 e antes até e na minha visão, para voltar a ser forte e reverter o atual cenário é trabalhar a base. Não a base da categoria, do setor metalúrgico, mas ir para os bairros, lá moram os trabalhadores, se apoderar de associações, igrejas, agremiações, enfim a gente tem que voltar para as nossas origens porque ali que estamos perdendo espaços.
Não só aqui, mas em diversas entidades, é alto o número de oposição. Não tua opinião, falta consciência de classe para os trabalhadores?
Falta informação. Consciência e um pouco de informação e deixamos isso acontecer ao longo dos anos. Um pouco porque a gente perde lá em 1985, 1986 com a extinção da OSPB (Organização Social e Política Brasileira). Então o que a nova geração tem? Nada de política. Com o que ele relaciona? Ah, eu não gosto de política. Ele não sabe que tem que diferencia o político das políticas, como as políticas sociais, da educação, saúde, ambiental. Se o trabalhador se apodera desse conhecimento quem sabe a gente muda a cabeça dele de pensar que política é tudo igual. Perdemos espaços porque todo pensam que política é uma só, porém ela está presente no dia a dia e é importante para a gente.
Na tua opinião, qual o principal desafio do movimento sindical no próximo período?
Na verdade, na minha opinião o nosso maior desafio é voltar para a base, para os bairros, que foi uma coisa que nos perdemos. Nosso desafio é sindicalizar a base e o sindicato começar a sair do papel de conquistas e direitos, ir para a parte social e inserir ali e fazer esse debate. Acho que esse é o maior desafio para termos maior clareza e mudança na geração futura. O Sindicato não pode ser só regulamentador de leis, mas tem que ensinar a base sobre a sua importância.
E da indústria? Como gerar empregos?
Primeiro passo é valorizar salários, mas neste momento, com essa política instalada no Brasil, a tendência é baixar salários. Tem o desemprego e as pessoas disputam esse desemprego, com a mão de obra a qualquer preço, isso derruba salários e o poder de compra, afeta a economia que fica estagnada. Quem começa a perder poder de compra no salário, consome menos. Uma grande sacada que eu penso é fazer a economia girar internamente. Exportações são boas? São boas para eles, mas faz com q a gente sofra, pois sobe a inflação e às vezes, a população não consegue comprar porque o dólar está alto. Para mim, a saída é investir na economia interna.
Muitas vezes, o trabalhador se associa para usar os serviços de saúde oferecidos. Como ter mais sócios para além dessa necessidade imediata?
Vejo uma carência muito grande dos trabalhadores em entender o processo de qual é a importância do Sindicato. Muitos se associam pensando em benefícios, muitos pela saúde porque não tem plano… Muito se tu não oferecer um serviço, ele não se associa. Quer uma contrapartida. A geração que veio depois dos direitos conquistados, acham que tudo é direito e sempre foi assim. Então ser sócios dos sindicatos pela luta e para fortalecer a classe, parece não ser interessante. Por isso, acho mais importante sair desse casulo de direitos e começar a trabalhar a questão social.
Gostaria de acrescentar algo?
Eu tenho muita esperança que os trabalhadores e a população abram os olhos e percebam que esse sistema que está aí não serve para o pobre, serve para o burguês. O capital vai se reinventar sempre, com a globalização abre muita disputa até chegar ao ponto de reduzir, e isso nunca será na matéria prima, mas no capital humano. Tenho esperança que a classe trabalhadora vai enxergar isso.
Fonte: STIMMMESL
Imagens: Israel Bento Gonçalves