Economista afirma que dados do Banco Central sinalizam que é possível baixar juros

Tanto na ata que o Banco Central (BC) soltou na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 22 de março, quanto no relatório trimestral de inflação do banco, já há indicativos de que a inflação está cedendo bastante, há uma tendência de desaceleração econômica muito forte, e existem indicadores de ociosidade relevantes principalmente no mercado de trabalho com sub-ocupação na taxa composta, uma sub-ocupação muito elevada. Isso tudo deveria influenciar para a Taxa Básica de Juros (Selic) cair.

A afirmação é do professor em economia da Unifesp, doutor em economia do desenvolvimento pela FEA-USP, e colunista do jornal Folha de São Paulo, André Roncaglia.

Segundo ele, o Copom age politicamente e prejudica a credibilidade do BC e existe ainda o hiato do produto, que é uma medida de distância entre o produto efetivo e a capacidade total de crescimento da economia que já está elevada.

“São muitos indicadores que evidenciam que a economia está iniciando um processo recessivo, como a paralisação e antecipação de férias de montadoras de carro, uma emergente crise de crédito no setor não financeiro da economia, o aumento da alavancagem das empresas, então há muitas indicadores que o próprio Banco Central cita, mas ele parece não incorporar nas decisões ou mesmo nas reflexões do Copom para sinalizar ao o mercado que ele vai iniciar eventualmente um processo de queda da taxa de juros”, complementa Roncaglia.

Mesmo com diversas sinalizações negativas da economia brasileira, e até mesmo das reflexões divulgadas pelo Copom, órgão do Banco Central que define a Taxa Selic a cada 45 dias, os juros básicos continuam muito altos no país, 13,45% segundo a última reunião do Comitê.

Juros afeta produção

Enquanto o Banco Central finge não enxergar o que acontece na economia brasileira, quem sofre são os trabalhadores. Nesta semana, a Mercedes-Benz, em São Bernardo do Campo (SP) divulgou boletim sobre a necessidade de redução no programa de produção, afirmando que os juros altos são um dos motivos para a queda na demanda.

De acordo com a Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef), a taxa de juros no mercado para aquisição de veículos ao ano chegou a 28,71% em dezembro de 2022.

A empresa anunciou ainda férias coletivas parciais, semanas curtas de trabalho e deve adotar um turno único de trabalho na fábrica de caminhões por um período de dois ou três meses. Com isso, a montadora alemã se junta a outras fabricantes de automóveis que estão reduzindo a produção em suas plantas pelo país, afetadas pelas altas taxas de juros que impedem o financiamento e compra de seus produtos.

“A alta dos juros afeta a vida do trabalhador que quer comprar um carro, por exemplo, já que o valor do financiamento fica muito mais caro e difícil de se obter, então as famílias tendem a adiar essa compra por conta das condições ruins de crédito. Muitas delas estão com pessoas desempregadas ou se encontram em empregos que têm baixa remuneração, não têm direitos, não têm garantias, e elas vão adiando a decisão de adquirir um automóvel ou mesmo de trocar de automóvel. E com isso o efeito vai bater nos pátios das montadoras que começam a ter dificuldade de circular a produção”, pontua Roncaglia.

Juros em descompasso com o mundo

Entre os dias 21 e 22 de março, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizou um seminário no Rio de Janeiro com o tema “Estratégias do Desenvolvimento Sustentável para o Século XXI”. Entre os convidados para os debates, além integrantes do governo federal e economistas brasileiros, estiveram presentes economistas renomados no exterior como o norte-americano prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz; a professora indiana de economia da Universidade de Massachusetts Amherst, Jayati Ghosh; e o economista norte-americano Jeffrey Sachs, entre outros.

Entre os estrangeiros, a percepção uníssona era de que o debate econômico na sociedade brasileira estava tomado por uma percepção exagerada sobre a austeridade fiscal e que os juros praticados aqui eram altíssimos e impraticáveis. “A taxa de juros de vocês de fato é chocante. Uma taxa de 13,7%, ou 8% real, é o tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia”, afirmou Joseph Stiglitz durante o evento.

Para André Roncaglia, essas críticas evidenciam o atraso no debate econômico brasileiro e servem para mostrar que estamos em descompasso com o que acontece no resto do mundo. “A gente precisa é de um plano de investimento, um projeto de investimento para auxiliar a transição ecológica da nossa economia e com isso angariar os recursos necessários para prover emprego, renda, garantir a atividade econômica num cenário geopolítico em transformação, em que a ordem do dia é essa, desenvolver grandes projetos de transformações estruturais para que você consiga financiar as economias de maneira não inflacionária, canalizando o dinheiro para os setores que vão gerar crescimento econômico lá na frente. Acho que foi muito feliz a ideia do BNDES de organizar esse evento para justamente mostrar que tem muito mais possibilidades para o país do que aquilo que o debate público no Brasil sugere”, finalizou o economista.

 

Fonte: CNM/CUT

Foto: Reprodução

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