Congresso precisa corrigir erros do governo e sustar liquidação do Ceitec

O ex-ministro do Trabalho e Previdência Social Miguel Rossetto e o presidente da Acceitec  (associação que representa os funcionários do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), Silvio Luís dos Reis Santos Junior, pediram ao Congresso Nacional a aprovação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 558/2020, que impede a extinção da estatal, única empresa brasileira que produz chips e semicondutores no país.

O PDL susta os efeitos do decreto nº 10.578, de 15 dezembro do ano passado, do presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL), que determinou a dissolução da estatal no momento em que o produto está em falta no mundo inteiro e presidentes de países como EUA e China investem pesado na ampliação de fábricas de chips.

O pedido de Rosseto e de  Santos Junior foi feito na audiência pública realizada nesta segunda-feira (25) na Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) do Senado que debateu a extinção do Ceitec, decisão que está, inclusive sendo investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que determinou a suspensão do processo de liquidação.

O PDL nº 558 é assinado pelos senadores Jaques Wagner (PT-BA), Jean Paul Prates (PT-RN), Humberto Costa (PT-PE), Paulo Paim (PT-RS) e Zenaide Maia (Pros-RN). Para eles, a extinção do Ceitec é prejudicial ao país. “Sua extinção poderá comprometer o posicionamento estratégico do Brasil na manutenção da vanguarda e do domínio tecnológico. A liquidação do Ceitec é um sinal de que o Brasil não deve ser visto como capaz de desenvolver tecnologia própria”, apontam no requerimento.

 

Congresso já reverteu extinção da Embrapa

Na audiência, Rossetto destacou que o Congresso já corrigiu erros deste e de outros governos passados e lembrou que o Legislativo já impediu até que a Embrapa fosse extinta. “Não podemos minimizar a decisão do TCU de sustar temporariamente o processo de liquidação do Ceitec. Significa que a própria corte de contas reconhece a inexistência de fundamentos que justifiquem a liquidação e reconhece também os prejuízos que isso pode causar ao país”, salientou.

O anúncio de liquidação do Ceitec tem provocado a migração de mão de obra qualificada para outros países. Segundo o presidente da Acceitec, a saída desses profissionais do mercado brasileiro terá grave impacto a longo prazo no que diz respeito ao domínio tecnológico. Para Sílvio, a liquidação da estatal também significa prejuízo com a perda de patentes de produtos de alto impacto social.

Ele citou o desenvolvimento de um sensor para teste rápido para a Covid-19, que teria grande precisão e rapidez para diagnosticar a doença com custos acessíveis. “Com a decisão da liquidação, este projeto não teve prosseguimento”, apontou.

 

Extinção causará dependência externa continuada em microeletrônica

O coordenador de Pós-Graduação em Microeletrônica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Tiago Roberto Balen, considera que a extinção do Ceitec coloca em risco toda a cadeia produtiva, não só na área de tecnologia, uma vez que os produtos fabricados ali são fundamentais para diversos setores.

Além do êxodo de talentos, o professor aponta que a decisão reduz o interesse de estudantes pela área e que, em longo prazo, causará a dependência externa continuada do País em microeletrônica.

Com 40 anos de experiência em microeletrônica, o engenheiro e físico Sérgio Bampi alegou que a Ceitec é muito mais que uma simples empresa, mas parte de uma estratégia de política industrial e tecnológica do Estado brasileiro.

“Não se mede eficiência de empresa que produz ciência e tecnologia somente pelo seu faturamento. Veja o orçamento Embrapa. Não se mede a importância dela pelo que ela fatura menos o que ela custa, que dá negativo. No entanto, todo o setor agropecuário brasileiro reconhece a importância das mais de cem unidades de pesquisa da Embrapa pelo país. E a Ceitec nada mais é que uma unidade de pesquisa eletrônica”, avaliou Bampi.

 

Não tem sentido a liquidação da Ceitec

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) prometeu buscar uma saída para evitar o encerramento das atividades da Ceitec. O parlamentar informou que vai entrar em contato com outros senadores e com os ministros Paulo Guedes, da Economia, e Marcus Pontes, da Ciência, Tecnologia e​ Inovações (MCTI), para tentar reverter a situação.

Para o senador, não tem sentido liquidar a instituição se ainda for possível captar recursos na iniciativa privada para viabilizá-la. Segundo Izalci, é necessário buscar uma saída que tenha incentivo do governo por se tratar de um setor estratégico para o país.

“Isso é assunto de Estado e precisa ser levado a sério. Se não tem investimento de imediato, vamos buscar uma solução. Liquidar é a decisão mais equivocada a ser tomada”, afirmou Lucas.

Os representantes do governo alegaram que a empresa é dependente de recursos do Tesouro, com resultados líquidos negativos ano após ano.

 

Extinção agrava crise de falta de chips

A extinção do Ceitec contribui para agravar a crise de falta de chips que atinge todo o mundo e reduz ou paralisa a produção de produtos como carros, geladeiras e celulares, entre outros.

Só a indústria automobilística estima perdas de produção de de 244,8 mil unidades até o fim deste ano. Segundo a Automotive Forecast Solutions (AFS), o problema já afetou ou afeta 14 fábricas de oito fabricantes de automóveis e comerciais leves no Brasil. Até agosto deste ano, foram produzidas 164 mil unidades contra 210 mil em agosto de 2020, em plena pandemia. É o pior resultado em agosto desde 2003.

Enquanto vários países investem elevados volumes de recursos na criação de novas fábricas de chips semicondutores, estatal brasileira criada em 2008 pelo ex-presidente Lula com o objetivo de tornar o Brasil um país autossustentável a longo prazo e até competir com mercados, como o da China e dos Estados Unidos, sofre com os desmandos deste governo.

 

Mais avançado centro de microeletrônica da América Latina

Sediada no bairro Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, a Ceitec é uma sociedade de economia mista (S.A.) de capital fechado e atua no segmento de semicondutores. É considerada o mais avançado centro de microeletrônica da América Latina, desenvolvendo e fabricando chips, etiquetas eletrônicas e sensores  nas áreas de logística, segurança, saúde e agronegócio. A fábrica é a única da América Latina capaz de produzir chip no silício, do começo ao fim.

É o único núcleo no continente capaz de produzir tecnologia de ponta para a fabricação de microchips para passaportes, componentes de satélites que usam tecnologia 5G, além de chips para monitoramento de armas e veículos.

 

Dona do terreno é contra extinção

Há outro elemento que pode atravancar as intenções do governo: o terreno sobre o qual está construída a CEITEC pertence a uma empresa que não aceita a dissolução. A Condor Empreendimentos Imobiliários sustenta que doou o terreno ao município em 2002 devido ao fato que ali seria implantado um centro de pesquisa.

Notificando extrajudicialmente o TCU, a Condor explica que, na época, “ao invés de receber pela desapropriação, efetuou a doação da área, com encargo”. Esse encargo seria “a efetiva implantação da atividade referida”, ou seja, a CEITEC, como consta do registro imobiliário citado na notificação.

A Condor ressalta que soube de intenção da venda através de notícias de jornal. Declarou discordar da ideia, “uma vez que afronta a condição da doação”. Se houver o fim do funcionamento do CEITEC, “o imóvel deve a toda evidência retornar à propriedade da então doadora, uma vez que a notificação foi com o encargo”.

 

Fonte: CUT Nacional

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