Seminário internacional: combate ao racismo não é luta só dos negros
Foi realizado, na manhã desta terça-feira (14), em Guarulhos (SP), o Seminário Internacional “Impactos do Racismo no Mundo do Trabalho”. O evento, que contou com a presença do ator norte-americano Danny Glover, foi a última atividade preparatória ao 9º Congresso Nacional dos (as) Metalúrgicos (as) da CUT, que começa na tarde desta terça-feira, também em Guarulhos, e que termina na sexta-feira (leia aqui). O Seminário discutiu o racismo nas relações de trabalho e ações concretas para o enfrentamento da desigualdade racial no mundo. O Seminário e o Congresso são promovidos pela Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT). As ações de apoio às lutas dos trabalhadores foram destacadas pelos palestrantes. No painel que contou com a presença de Danny Glover, os convidados relataram suas experiências e resultados das campanhas de solidariedade às organizações sindicais.
A mesa foi coordenada pela secretária de Igualdade Racial da CNM/CUT, Christiane dos Santos, e também contou com a presença do diretor de Política de Herança Cultural do Smithsonian Institute, James Counts Early, da vice-presidente do Numsa (União dos Trabalhadores Metalúrgicos da África do Sul), Christine Oliver, e do presidente da CNM/CUT, Paulo Cayres. Danny Glover – que é um importante ativista dos direitos civis na América do Norte – elogiou as lutas dos sindicatos brasileiros no processo de construção da democracia brasileira. “Os sindicatos brasileiros sempre estiveram à frente da luta em favor dos direitos civis. O Brasil ainda não se deu conta do seu potencial no mundo. Nos, norte-americanos, observamos o Brasil como um país transformador nas relações de trabalho. No que diz respeito às ações globais, precisamos nos unir neste momento de crise financeira mundial. Esta crise aumenta a precarização dos trabalhos. Por isso, nossa luta é permanente”, afirmou.
O ator e ativista também agradeceu o apoio da CNM/CUT na campanha de solidariedade aos trabalhadores na unidade da Nissan em Canton, Mississipi, que são proibidos de se sindicalizar. “A CNM/CUT nos deu um apoio incondicional nesta luta. E este apoio foi além, porque o Mississipi não é um lugar muito amistoso para os negros dos norte-americanos. Ainda não conseguimos a sindicalização, mas estamos avançando com a organização dos trabalhadores”, contou Glover, que também preside o Fórum TransAfrica – maior e mais antiga ONG dedicada aos direitos da comunidade afrodescendente.
A sindicalista Christiane Oliver, por sua vez, falou do processo de democratização na África do Sul e das desigualdades que ainda existem em seu país, mesmo após o fim do apartheid, regime de segregação racial adotado de 1948 a 1994. “Achávamos que com o fim do apartheid nós iríamos ter liberdade econômica. Mas, infelizmente, o capitalismo é global, branco e monopolista. Os brancos na África ganham oito vezes mais do que os negros . E no caso da mulher, a desigualdade é ainda maior. A mulher negra ganha apenas 70% do salário do homem negro”.
Já James Early abordou a importância do movimento sindical brasileiro para a conscientização do tema igualdade racial no espaço de trabalho e na sociedade. “A luta contra o racismo é uma luta pela cidadania plena de todos os norte-americanos e os sindicatos estão participando desta luta. Não teremos uma democracia plena sem a participação do negro em espaços de poder em todos os países. Tenho certeza de que nos próximos 25 anos o Brasil será o país mais importante de toda a América. Por isso, precisamos trabalhar junto com sindicatos brasileiros desde já para colocar este tema como a principal bandeira de luta”, disse.
O racismo no Brasil
No primeiro painel do evento, coordenado pela secretária de Mulher da CNM/CUT, Marli Melo, foram discutidas as dificuldades de inclusão da população negra na sociedade de classes e no mercado de trabalho. Para isso, foi convidado Silvio Luiz de Almeida, doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e presidente do Instituto Luiz Gama, organização que atua na defesa das causas populares, com ênfase nas questões sobre negros, minorias e os direitos humanos.
Segundo o professor, o mercado de trabalho revela a forma mais brutal de racismo e discriminação no Brasil porque as exigências são cada vez maiores. “Agora a questão não é só ter o diploma. É preciso pensar o que os negros farão com os diplomas se o mercado de trabalho é discriminatório. O discurso da meritocracia disfarça o preconceito contra negros e negras. Os negros representam mais de 50% da população brasileira, mas não conseguem espaço para atingir os melhores postos de trabalho”, disse. O acadêmico também reforçou que o PL 4330 da terceirização agrava ainda mais a situação do negro no mercado de trabalho. “Lutar contra a terceirização é lutar contra a precarização do trabalho; lutar contra esta precarização é lutar contra a intensificação do racismo no trabalho”, observou.
Abertura
A mesa de abertura contou com a participação do presidente da CNM/CUT, Paulo Cayres, da secretária de Igualdade Racial da CNM/CUT, Christiane Aparecida dos Santos, da secretária nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Júlia Reis Nogueira, e do representante da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, Ronaldo Barros. Christiane dos Santos lembrou que a Secretaria de Igualde Racial foi criada no último Congresso dos Metalúrgicos da CUT, em 2011, e das principais ações desenvolvidas em relação ao tema.
“A CNM/CUT também investiu na formação e no debate sobre o tema. Infelizmente, o movimento sindical não prioriza as questões raciais, de juventude e de mulher. Este seminário é um dos avanços na pasta, além do Curso de Formação Sindical 'Combate ao Racismo para a Construção da Igualdade Racial' que formou dirigentes de todo país. Ao final deste curso, demos um grande passo com a criação do Coletivo Nacional de Igualdade Racial para levar as ações afirmativas dentro dos sindicatos e federações”, explicou.
Em sua intervenção, Paulo Cayres destacou a importância do movimento sindical para a desconstrução do racismo no Brasil. “Esta é uma luta permanente. Nós, que estamos aqui neste seminário, somos multiplicadores de informações sobre o tema. Este seminário foi desenvolvimento para dar elementos para combater o racismo no dia a dia. O movimento sindical nunca encontrou facilidades e esta luta contra o racismo não vamos deixar de lado”, disse.
Para Maria Júlia Reis Nogueira, as mudanças ocorridas nos últimos anos, com a implantação de políticas públicas diminuíram substancialmente as desigualdades raciais no Brasil. “Antes do governo do ex-presidente Lula, os negros e as negras eram invisíveis. Hoje, a população negra está nas universidades, nos aeroportos e houve a ascensão de muitos à classe média. Porém estes avanços têm gerado insatisfação, intolerância e ações racistas pela elite branca”, afirmou. “É preciso destacar que o racismo não será vencido enquanto for apenas a luta dos negros”, completou. Já Ronaldo Barros avaliou que parte da elevada taxa de homicídio dos jovens negros deve ser atribuída ao racismo.
“Segundo dados do Mapa da Violência 2014, o país registra homicídio de 30 mil jovens por ano e dessas mortes quase 80% das vítimas eram negras. Não podemos desconsiderar a relação de classe social no fortalecimento deste racismo. Precisamos de um governo de trabalhadores para estar presente nas universidades, em cargos importantes no mercado de trabalho e em espaços de representatividade”, finalizou.
Fonte: Shayane Servilha – Assessoria de Imprensa da CNM/CUT