Salário mínimo sem aumento real empobrece trabalhador e tira R$ 7 bilhões da economia

Passeata das centrais

Em 2020, pela primeira vez em 17 anos o salário mínimo será reajustado apenas pela inflação, sem aumento real. A decisão do presidente Jair Bolsonaro (PSL) joga no lixo uma política de valorização do mínimo que não só elevou o padrão de renda de trabalhadores e aposentados, como teve papel central na sustentação da economia do país desde 2004, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu início aos reajustes acima da inflação.

Essa política seria consolidada em 2006, com a regra de aumento pela inflação do ano anterior mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Se aplicada em 2020, além do reajuste inflacionário, os 48 milhões de brasileiros que recebem salários e aposentadorias referenciados no mínimo teriam mais 1,1% de aumento pelo PIB de 2018 – o que daria cerca de R$ 7 bilhões a mais circulado na economia.

“É uma questão estratégica promover o desenvolvimento através da difusão do consumo, através do estímulo ao mercado interno. Sem esse estímulo, a gente tem uma economia cada vez mais dependente do exterior e isso, obviamente, tende a comprometer ainda mais o potencial do Brasil de sair desse quadro recessivo que já dura cinco anos”, afirma o economista Márcio Pochmann, da Fundação Perseu Abramo.

A valorização do mínimo, com aumento real, é peça-chave do desenvolvimento e da recuperação da economia brasileira por meio das chamadas medidas anticíclicas, como uma espécie de blindagem da economia para as variações e crises externas, segundo explica Arthur Henrique da Silva, ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) entre 2006 e 2012.

“Políticas anticíclicas, que são importantes do ponto de vista econômico, para que aconteça o desenvolvimento econômico local, têm tudo a ver com o salário mínimo, ainda mais se levar em consideração que no Brasil 70% da população recebe até dois salários mínimos. Aí falando de trabalhadores, informais, aposentados e pensionistas”, disse.

A ideia de valorização do mínimo surgiu entre 2003 e 2004, e ganhou força com uma série de marchas realizadas pelas centrais sindicais até Brasília.

“A primeira foi em 2004 e andamos 40 quilômetros. Era dezembro, porque tinha que garantir o espaço no Orçamento do ano seguinte. Essa primeira marcha teve uma resposta do governo interessante porque nós ganhamos uma opinião de maioria dentro do governo, porque tinha gente que era contra, o pessoal da área financeira dizendo que ia dar problemas. Conseguimos o aumento para R$ 300, que era oito pontos acima da inflação”, lembra Arthur Henrique.

O piso de R$ 300 passou a valer em maio de 2005. O valor anterior era de R$ 260. Esse foi o pontapé inicial para um dos pontos mais importantes no conjunto de políticas públicas do governo brasileiro à época.

Segundo Márcio Pochmann, a política teve impacto na economia como um todo, ajudando a manter a população com renda digna nas pequenas cidades, reduzindo a desigualdade e distribuindo renda.

“Tivemos períodos [históricos] de valores reais altos e valores reais baixos, especialmente em períodos autoritários, em que o valor do salário mínimo foi muito baixo. Em períodos democráticos, o salário mínimo teve um valor de recuperação. Justamente nestes períodos democráticos de crescimento do salário mínimo, a participação da renda do trabalho na renda nacional cresceu”, afirma.

Desigualdades

Com o fim da política de valorização, o governo Bolsonaro definiu no Orçamento para 2020 que o piso será atualizado pela inflação do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), do IBGE, e só. A estimativa, feita em agosto, era de 4,02% – de R$ 998 para R$ 1.039.

Para Pochmann, o retrocesso representa a manutenção das desigualdades.

“Isso favorece ainda mais a concentração de renda, principalmente na mão dos proprietários, de terra, de imóveis, de fábricas e dos bancos. Nesse sentido, o salário mínimo é um elemento central no conflito entre o trabalho e o capital, especialmente na luta pela apropriação do excedente gerado na economia”, disse.

Nos 13 anos de governos Lula e Dilma, o mínimo aumentou de R$ 200 para R$ 880, em 2016, um crescimento de 340% do valor nominal e 77% de aumento real – média anual de 5,9%.

Fonte: Brasil de Fato

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