“Temos que qualificar mais o dirigente sindical”, afirma o motorista do movimento sindical, Nelson Folharini 

Bastante conhecido no movimento sindical gaúcho, Nelson Folharini tem 60 anos e é chamado de Nelsão. Desde o começo da década de 1990 dirige os caminhões de sons dos sindicatos da região metropolitana. Natural de Sobradinho, ex-metalúrgico e ex-dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas e Nova Santa Rita, ele vive em Sapucaia do Sul e é casado há 36 anos com a Teresinha. “Minha companheira sempre entendeu o meu trabalho”, garante.

Nesta entrevista de sexta-feira (21), Nelsão lembra diversas histórias e experiências que vivenciou, mas lamenta a atual realidade do movimento sindical. “Na minha época, parecia que havia mais formação, participávamos mais de congresso, seminários… Precisamos sentar e aprender. Os dirigentes precisam participar mais dentro da fábrica e no sindicato”, avalia.

 

Confira a íntegra da entrevista 

Conte um pouco da sua história? Como entrou no movimento sindical? 

Eu comecei em 1980, na Ferramentas Gedore em São Leopoldo, ali fiquei por seis anos e meio. Depois fui para Micheleto, em Canoas, lá conheci uma pessoa, o seu Chico, com quem conversei bastante sobre política e sindicato, aprendi muito com ele que era dirigente sindical e tinha uma grande experiência. Ele já estava discutindo comigo para entrar na direção do Sindicato de Canoas, mas por uma infelicidade alguém entregou que eu estava reunindo com o Sindicato e a empresa me demitiu, voltei para a Gedore trabalhei mais seis meses e voltei para Ikro, em Canoas, uma fábrica de componentes eletrônicos e nisso já estava quase vencendo o prazo de inscrever a chapa. Mas consegui, entrei na chapa em 1989 e por uma empresa muito difícil, onde eles não tinham até então um dirigente sindical, fui o primeiro, eu e o companheiro Douglas. Em 1991, fizemos uma greve na empresa que nunca tinha parado e no final da greve, me demitiram. Eu tive um processo na justiça por mais de cinco anos, neste período o sindicato pagava meu salário, pois eu já era o motorista de caminhão. Isso foi muito importante para mim e comecei a viajar pelo estado, eleição aqui, eleição em Erechim, em Passo Fundo, Carazinho, Santa Cruz, Venâncio e fui aprendendo, amadurecendo no movimento sindical, foi muito rica a minha luta pelo estado e não parou por aí. Na época do governo Brito, as lutas dos pequenos agricultores, do MST, professores, metalúrgicos e eu estava quase toda semana em Porto Alegre, na frente ao Palácio Piratini com uma categoria diferente e acabei conhecido no movimento sindical. Em 1995, perdi a questão na justiça, mas já tinha a certeira assinada no sindicato e em 1995 fui para São Bernardo do Campo, pois eles compraram um caminhão que está lá até hoje, fiquei 19 dias em São Bernardo e nestes dias, assei um churrasco na casa do Lula, tenho muito orgulho disso. Fiquei no sindicato, como funcionário, por mais três anos. Em 2000 concorri a vereador em Sapucaia, fiz 379 votos, me faltou 150 votos para ser eleito, na época foi uma decepção o resultado, mas tive um aprendizado muito grande. Ainda em 2000, fui para estrada e 2009 voltei para a política, o Balin ganhou a prefeitura de Sapucaia e perguntou por onde eu andava, ele sabia que tinha um caminhão… “Vende esse caminhão que preciso de você aqui”, ele me disse. Eu assisti o resultado das eleições num posto lá em Lajeado e voltei direto para prefeitura, fiquei oito anos e faltando dois para encerrar o mandato, o Valmir, presidente do Sindicato aqui em São Leopoldo, comprou o caminhão em Sorocaba e me ligou perguntando qual era o meu horário na prefeitura, disse que das 11h15 às 18h15 e ele “excelente, o Sindicato comprou um caminhão de som  e tu vai ser o nosso motorista”, acabei vindo para cá. E hoje estou tocando a vida.

 

 

Você esteve um período no Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas e Nova Santa Rita. Como foi a experiência? 

Foi uma experiência muito boa e curta, eu tive dois anos dentro da fábrica junto com o peão. E trabalhava de noite, com 10, 12 funcionários, não trabalhei junto com a massa dos trabalhadores e a maioria eram mulheres. Dentro da fábrica foi isso, mas aprendi muito em seminários congressos, cursos, mesmo como motorista sempre tive liberdade com os dirigentes e até hoje me procuram para saber minha opinião. Eu até me emociono, fiquei muito tempo fora de casa, fiz eleição eu Criciúma, Jaraguá do Sul, São Bento do Sul, duas vezes em Joinville, no Paraná e eu viajei, cheguei a ficar 34 dias fora de casa e minha companheira sempre entendeu o meu trabalho. Nestas andanças, eu aprendi muito, não aprendi no chão da fábrica, mas fora.

 

Atualmente você é o motorista oficial do movimento sindical aqui da região metropolitana. Como é contribuir para a luta sindical dessa maneira? 

Não sei se tenho noção, mas acho que hoje nos meus 60 anos, contribui bastante. A partir do momento que tu vai para uma eleição, participa de uma greve, tu já está contribuindo. Porque tu fica conhecido, a partir disso tu sente que está contribuindo, tua presença está ali.

 

Com toda a tua experiência, o que mais te marcou nestes anos todos? 

Lá em Erechim, ficamos 20 poucos dias numa ocupação de uma fábrica de panelas, os trabalhadores ocuparam… Me marcou porque depois de um ano, construíram a cooperativa e nos chamaram para um churrasco e isso marcou muito, porque convidaram que ajudou eles naquela conquista, isso foi em 1996 ou 1997, não tenho certeza. Outras coisas me marcaram, uma eleição de Caxias do Sul em 1992, onde o atual presidente de um sindicato era vice na época, e voltei ano passado para ajudar ele na eleição. Outra coisa que me marca muito é o carinho dos dirigentes sindicais, sempre fui muito bem tratado. Mais uma coisa, na eleição do Olívio Dutra para governador, no segundo turno, o Sindicato dos Metalúrgicos de Joinville ligou para o Chitolina, que hoje é presidente do Sindicato de Canoas, e falaram que queriam ajudar na eleição, mas só liberariam o caminhão se fosse pro Nelsão, na época eu estava em Rio Grande. Isso me marcou muito, foram me buscar e fui a Joinville, só passei em casa para pegar umas roupas, sai de lá de tardezinha, de manhã cedo já estava aqui em Porto Alegre e tinha que chegar em Rio Grande até às 13h para poder atravessar a balsa porque teria um ato de noite em São José do Norte, isso tudo correndo, dormindo pouco, mas elegemos o Olívio.

 

Na tua avaliação, qual a importância do movimento sindical na luta de classes? 

Hoje está muito difícil fazer avaliações… Temos que qualificar mais o dirigente sindical. Eles pegam a estabilidade e só, tem dirigente que não consegue associar, que sequer participa, que vem para o sindicato… Na minha época, parecia que havia mais formação, participávamos mais de congresso, seminários. Precisamos sentar e aprender. Os dirigentes precisam participar mais dentro da fábrica e no sindicato.

 

O movimento sindical, como um todo, está muito desacreditado. Como reverter isso? 

É muito difícil, eu não vejo um horizonte. Como tu vai trazer a base? É muito difícil pela conjuntura que estamos passando com um presidente como esse, que representa a burguesia do país, que esqueceu da classe trabalhadora, que retirou os nossos direitos. Parece que o pessoal se acomodou, talvez eu não veja mais um movimento sindical combativo, com sindicatos na linha de frente das lutas. Eu não vejo uma luz no fim do túnel. Tomara que eu esteja errado, mas acho que cada vez mais eles ficarão acomodados. Não vejo na juventude vontade de seguir a luta.

 

 

Qual a tua avaliação dos ataques que a classe trabalhadora tem sofrido desde o golpe de 2016. Como as reformas trabalhistas e da previdência? 

Vejo que a partir do golpe que tirou companheira Dilma, eles vieram para repreender, em primeiro lugar, vieram para acabar com o movimento sindical, com as lutas do povo na rua, vieram com uma repressão furiosa, temos um exemplo aqui em um trancaso da BR116, vieram com bombas de gás lacrimogêneo, como se fossemos uma tropa de bandidos. Qual é o papel do Bolsonaro? Vou acabar com o movimento sindical para esse aí não me incomodar mais, quero governar do meu jeito. Então veio com essa ditadura que não é ditadura explícita, mas é velada, uma ditadura bolsonarista, hoje tu não pode vestir a camisa do Brasil, por exemplo. Além dos direitos que foram tirados através das reformas que só prejudicaram os trabalhadores.

 

Não tua opinião, falta consciência de classe para os trabalhadores? 

Sim, falta muito. Hoje dependendo da fábrica, o sindicato vai lá e mal tem atenção dos trabalhadores, tem empresas que falamos para as paredes. Quando tu vai numa empresa e o trabalhador não vai te escutar, já mostra que não tem consciência. Por outro lado, é bonito quando os trabalhadores param e escutam o sindicato, quando eles dão parabéns pelo aumento, pelas conquistas, pelo reajuste do INPC. É muito triste o trabalhador não ter consciência de classe. Claro, não são todos, mas a maioria

 

Qual o principal desafio do movimento sindical no próximo período? 

Acho que, na minha avaliação, é voltar a formar dirigente sindical capacitado e fazer o enfrentamento da luta, só que hoje, acho difícil, pois o pessoal antigo já se aposentou e acho que com a juventude de hoje, tu não consegue fazer nada. Os dirigentes antigos, amanhã ou depois, vão sair e como vai ficar? Só Deus sabe…

 

O que os sindicatos podem fazer para conquistar mais sócios? 

Só tem uma coisa, é conscientizar os trabalhadores, ir para portas de fábricas, botar o caminhão de som, fazer campanhas bem organizadas com brindes, explicar que o sindicato está fragilizado devido a esse governo e que o sindicato tem toda uma estrutura para auxiliar os trabalhadores. E fazer um bom trabalho, com bom trabalho se traz o sócio.

 

 

Gostaria de acrescentar alguma coisa? 

Gostei muito da entrevista, foi muito rica. Já passei por momentos difíceis, sem dinheiro, fiquei sem fábrica, mas não me arrependo uma vírgula, faria tudo de novo. Aprendi muito com o movimento sindical. Faria tudo de novo.

 

Fonte: STIMMMESL

Imagens: Israel Bento Gonçalves

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