Decisões judiciais consideram válidas demissões comunicadas por WhatsApp

Imagine acordar em uma manhã com uma mensagem da chefia no seu WhatsApp, curta e grossa, avisando que você perdeu o emprego. Esta tem sido uma realidade para muitos trabalhadores e trabalhadoras nos últimos tempos. O primeiro sentimento é de incredulidade, negação; o segundo de constrangimento pela humilhação, falta de consideração. O terceiro, a raiva que precisa ser elaborada para pensar o que pode ser feito para exigir respeito.

Reclamar na Justiça para exigir respeito não tem dado muito resultado. Várias decisões judiciais já têm reconhecido a legalidade da prática, considerando que o WhatsApp é uma ferramenta de comunicação válida, cujo uso para as relações profissionais se intensificou durante a pandemia. E mais, juízes não enxergam nisso um constrangimento ou humilhação.

“Todo processo demissionário deveria ser humanizado e respeitoso”, defende o secretário de Relações do Trabalho da CUT, Ari Aloraldo Nascimento.

“Antes de tudo deveria ser precedido da abertura de canais de diálogo ou negociação com participação dos trabalhadores, tendo o sindicato papel fundamental nesta articulação, junto à empresa”, ressalta o dirigente.

O secretário reforça que, ao contrário dessa ‘mecanização’, deveriam ser seguidos, minimamente, os preceitos de dignidade e diálogo social, defendidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) na promoção do trabalho.

Ari afirma que a prática é imoral, ainda que não ilegal. E não é uma novidade para a classe trabalhadora. “Quantas e quantas categorias já tiveram que confrontar demissões feitas através de cartas e telegramas, sobretudo com trabalhadoras e trabalhadores em períodos de férias, em feriados ou em pleno Natal?”.

Os casos de demissões por WhatsApp não têm sido poucos. De acordo com levantamento do Data Lawyer Insights, plataforma que levanta dados estatísticos sobre processos, divulgado pelo Valor Econômico, desde março de 2020, 103 mil processos continham a combinação de palavras demissão e WhatsApp, apesar de nem todos terem como motivação a demissão por meio do aplicativo.

Em um dos casos, no ano passado, em São Paulo, uma coordenadora pedagógica perdeu a ação movida contra a escola infantil onde trabalhava. Ela questionava a disparidade entre a data em que fora dispensada pelo WhatsApp (2 de abril) e a data de baixa efetiva da carteira de trabalho pelo e-Social (18 de agosto, reivindicando pagamento de verbas rescisórias durante o período.

O entendimento dos magistrados da 18ª Turma da Justiça do Trabalho de São Paulo foi de que houve prova legal sobre o encerramento do contrato na “data da comunicação eletrônica”, ou seja, pelo aplicativo de mensagens.

As mensagens trocadas por esse instrumento são amplamente aceitas como meio de prova nos tribunais”, afirmou a desembargadora-relatora do processo, Rilma Aparecida Hemetério.

Antes da pandemia, casos semelhantes já aconteciam. Em 2017, o juiz do Trabalho, Carlos Alves Magalhães, da 3ª Vara do Trabalho de Uberlândia (MG) negou pedido de um trabalhador demitido pelo WhatsApp, considerando que a prática não se configura dano moral.

 

Não ao ‘novo normal’

Apesar das decisões judiciais favoráveis aos patrões, o secretário de Relações do Trabalho da CUT considera que não se pode naturalizar esse tipo de relação entre empregadores e trabalhadores. “Não podemos achar ‘normal’ um patrão, que já detém uma forma de poder sobre o trabalhador, expô-lo a situações de humilhação. É algo que prejudica até a saúde mental“, explica se referindo a sentimentos oriundos dessas situações como angústia, ansiedade e depressão.

“É um sentimento de descarte. Se a tecnologia permite esse caminho, que pelo menos o empregador o faça de forma minimante oficial e cordial, por vídeo, respeitando a pessoa humana, sobretudo”, diz Ari Aloraldo.

A reforma Trabalhista, segundo o dirigente,  facilitou esses abusos. “Abriu espaço para legalizar essa prática ao eliminar a mediação do sindicato em casos de demissão, portanto, essa é mais uma consequência nociva da reforma aos trabalhadores”.

Apesar dos muitos casos considerados legais pela Justiça, os trabalhadores e as trabalhadores não devem desistir de ir atrás do seu direito e os sindicatos têm papel fundamental na orientação e proteção nesses momentos, conclui o dirigente.

 

Fonte: CUT Nacional

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