“O movimento sindical tem que resgatar a luta de classe”, diz o ex-dirigente do STIMMMESL, Elias Tramontin

Por quinze anos, de 2003 até 2018, Elias Tramontin integrou a direção do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de São Leopoldo Região (STIMMMESL), na executiva da entidade ocupou a tesouraria e após a secretaria de Comunicação. Em 1991, começou a trabalhar na Bombas Geremia e cinco anos depois, a empresa iniciou a transição para se tornar Weatherford e em 2017 encerrou as atividades, com isso, Elias ficou sem base e não pode mais integrar a direção do Sindicato.

Casado e pai de duas filhas, hoje com 52 anos, ele trabalha na prefeitura do município e divide seu tempo entre São Leopoldo e um sítio em Lomba Grande. Nesta entrevista de sexta-feira (25), Elias recorda algumas histórias de quando integrava o STIMMMESL e garante que o conhecimento que adquiriu como diretor sindical foi o mais importante.  “Mudei muito a minha maneira de ser, passei a ouvir mais as pessoas, ter mais tranquilidade para resolver os problemas”.

Confira a íntegra da entrevista:

Conte um pouco da sua história. Como entrou no movimento sindical?

Entrei no movimento sindical através dos companheiros de fábricas. Sempre estive na luta como participante de comissão de PLR e viram na minha pessoa uma certa liderança. Através disso, no ano de 2003, tomei a decisão de entrar na direção do Sindicato e defender a classe, os trabalhadores dentro da fábrica e lutar pelos nossos direitos.

 

O que mais te marcou na tua experiência como dirigente sindical?

O conhecimento. O conhecimento que tive neste período foi fantástico. Mudei muito a minha maneira de ser, passei a ouvir mais as pessoas, ter mais tranquilidade para resolver os problemas. No início, a gente tinha impressão de que o movimento sindical seria para resolver imediatamente as coisas e às vezes não é assim, você tem que dar um passo para frente e dois para trás para seguir adiante. Foi uma experiência muito boa e a gente conseguiu fazer um excelente trabalho.

Muitos diretores entram no movimento sindical após serem cipeiros ou negociadores de PLR. Qual a importância dessas ferramentas, tanto para os trabalhadores, como para os sindicatos?

Em primeiro lugar, na PLR é fundamental fazer a disputa da comissão, poder participar e negociar porque as empresas querem implantar uma maneira que favorece a elas, por mais que tenha que distribuir. Às vezes, colocam pessoas na comissão, por parte da empresa, que optam por discutir uma fórmula que as próprias sejam beneficiadas e a questão da Participação é contemplar todo mundo, independente do cara ser varredor no chão de fábrica ou o engenheiro da empresa. Fiz muito essa disputa quando participei por três anos consecutivos da comissão de PLR da Weatherford, eles tinham uma restrição que a partir dos três anos não podia mais participar e neste período desempenhei um papel fundamental de poder fazer com que a participação fosse dividida em partes iguais, ao menos 50% da folha e o restante de acordo com os salários. A comissão por parte da empresa queria fazer tudo por percentual de salário, então quem ganhavam mais, que eram os diretores, seriam amplamente beneficiados, ao contrário dos trabalhadores. E na ocasião, tínhamos as penalidades, se a pessoa tivesse falta, alguma coisa, perdia um mês na participação. Esse valor era somado separadamente e quem atingisse menos faltas, dividiria aquele valor que os outros trabalhadores tinham perdido. Na época, entrei em conflito com a empresa porque havia alguns gerentes que não assinalavam o ponto enquanto o trabalhador assinalava e por ventura, se tivesse algum incidente no percurso, um atraso ou propriamente uma doença que o acometesse perdia um mês da participação dele e na hora de repartir, todos os 14 supervisores usufruíram desse valor. Foi um conflito muito grande e eu consegui com a comissão que representava os trabalhadores, eliminar isso. Para mim foi um imenso orgulho, pois foi uma luta bastante grande que travamos com a empresa.

Atualmente, você trabalha no poder público, como a experiência aqui no Sindicato te ajudou?

Olha, hoje trabalhando no poder público, sei que a riqueza de conhecimento que tive no Sindicato foi fundamental. Na maneira de abordar as pessoas principalmente, atender os chamados… Trabalho muito na parte de campo, na rua e vou aonde as pessoas tem um problema iminente que está batendo na porta, atrapalhando a vida e com a experiência adquirida no Sindicato, consigo tratar isso com tranquilidade e também com bastante transparência, porque quando vamos abordar ou dar uma resposta ao cidadão a gente tem que ser transparente, a gente não pode mentir ou criar uma falsa ilusão que o serviço será executado em uma duas semanas, quando na verdade isso não acontece. Então, a gente tem muito isso, com a experiência adquirida aqui, fazer uma boa fala, dizer que estamos ali representando o governo, conversar, orientar porque, às vezes também, as pessoas  tem alguns problemas que elas próprias poderiam resolver mas não sabem, falta o conhecimento, saber o local onde procurar, fazemos muito esse trabalho graças a nossa experiência aqui no Sindicato.

Você acha que falta consciência de classe para os trabalhadores?

Muita. O trabalhador é muito iludido por parte da patronal e porque o jogo do capital é trabalho é muito pesado. Então nós, sindicalistas, defendemos que o trabalhador deve procurar sua ferramenta de luta porque se ele for bater de frente, a gente sabe que ele será fuzilado, sofrer sanções, ser demitido, mas infelizmente a maioria dos trabalhadores não tem essa noção. Eles preferem usar o termo de digamos, ficar babando a patronal, o chefe e ficar se colocando numa situação de risco, pois acaba colocando os direitos consagrados na mão do patrão. Muitas vezes vemos trabalhadores com FGTS, férias atrasados e a gente, no caso quando fazia parte da direção do Sindicato, ia até esses trabalhadores e explicava o que poderia acontecer e mesmo assim diziam “não, assim que o patrão me demitir, ele vai pôr em dia” e várias vezes, as empresas acabam por fechar as portas, na reta final levantar acampamento e não tem mais o que cobrar. Aí o trabalhador que entrar na justiça, mas não adianta judicializar uma ação se você não sabe nem aonde a empresa foi.

Qual a tua avaliação dos ataques que a classe trabalhadora tem sofrido desde o golpe de 2016. Como as reformas trabalhistas e da previdência?

A direita veio com tudo neste ataque e o principal mentor foi o Michel Temer, dado sequencia pelo presidente Bolsonaro na questão da reforma da previdência. Se os trabalhadores não tomarem consciência de que precisam voltar a fazer a luta de classe, disputa de capital e trabalho, a tendência é levarmos vários anos para reconquistar os nossos direitos consagrados e constituídos depois de 20, 30 anos de lutas. Desde o ano 1990 que a gente, independentemente de estar no chão de fábrica ou no Sindicato, sempre participava das lutas e das greves. Então, os trabalhadores tem que ter a consciência de que precisam dar essa contribuição para resgatar os direitos se não vai ser muito difícil. O movimento sindical sozinho não pode fazer nada, ele é um escudo do trabalhador, mas por trás do movimento sindical está o trabalhador empurrando para a gente fazer a luta.

O movimento sindical, como um todo, está muito desacreditado. Como reverter isso?

Precisa se reinventar, tem muitas tecnologias novas e o movimento sindical tem que se apropriar disso, dessas ferramentas. E também, ter o trabalho incessante do dirigente sindical na categoria. Ele precisa ter o conhecimento necessário, tem que se preparar, para fazer a disputa no chão de fábrica, nas portas das empresas, no dia a dia e não medir esforços nos 365 dias do ano, tem que botar na cabeça que é dirigente sindical e que está ali para defender a classe trabalhadora, foi eleito para isso e tem que dar essa resposta. O movimento sindical tem que resgatar a luta de classe, tem que botar o pé na rua para poder buscar o reconhecimento da categoria, sempre com transparência, acima de tudo.

Na tua opinião, qual o principal desafio do movimento sindical no próximo período?

Acho que tem um desafio muito grande que passa pela questão das eleições, onde envolve um projeto de governo que ampare o pobre, que busque a geração de emprego e renda enquanto o outro lado, da extrema direita, pensa e acabar com tudo. Tanto que hoje constantemente se fala em retirar 13º salário, férias e FGTS… Então, a disputa da eleição passa pela reinvenção do Sindicato e colocar isso como pauta principal para reverter toda a situação que hoje tem de  descredibilidade do Sindicato e poder, juntamente com um governo de esquerda, um governo progressista, ter um bom rumo para nosso país.

E da indústria? Como gerar empregos?

Passa muito também, pela parte econômica do governo. Porque o governo tem que ter um olhar diferenciado para as indústrias, a questão econômica tem que tomar um rumo de garantir algumas coisas para que o empresário possa investir, gerar emprego, renda e no caso alavancar a economia… É esse o caminho não tem outra coisa, a não ser o modelo econômico direcionado, que dê o suporte para indústria através de linhas de crédito, financiamentos, que tenha uma garantia de investimento para assim gerar os empregos necessários.

Como atrair mais sócios para o sindicato?

Essa questão é algo que temos que ter várias maneiras de atrair sócios. Não podemos apenas pensar nisso através do assistencialismo, temos que pensar em atrair sócios através do trabalho sindical, atendendo as demandas dos trabalhadores no dia a dia, no chão de fábrica, explicando para eles os direitos que eles tem e aonde podem chegar. Claro que dentro disso, entra algumas coisas, como o Sindicato tem uma grande estrutura isso ajuda também, mas não é tudo. Essa questão do assistencialismo, logo ali adiante, o Sindicato vira refém, porque se não consegue manter uma estrutura médica, odontológica, lazer, enfim, acaba por perder o sócio, o que é muito ruim. Então o trabalhador precisa entender que a ferramenta de luta dele está no dia a dia, está à disposição dele e por isso precisa ser sócio, para o Sindicato ter força de lutar por ele.

 

Gostaria de acrescentar alguma coisa?

Que estes 15 anos me enriqueceu muito. A gradeço pelo conhecimento e, graças a Deus, hoje temos muitos conhecidos do tempo que fizemos parte da direção do Sindicato e isso fica. É um legado que me deixa muito orgulhoso e posso dizer que fizemos um trabalho, cumprimos o nosso papel de cabeça erguida e hoje quando retorno aqui na casa, tenho o respeito de todo mundo.

 

Fonte: STIMMMESL

Imagens: Israel Bento Gonçalves

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