Investigação aponta que suicídio de trabalhador na Rlam foi por condição de trabalho
Investigação foi feita feitas em atendimento à denúncia formulada pelo Sindipetro da Bahia.
nas dependências da Unidade de Desoleificação a Propano, na refinaria (atual U-13).
O Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador (Cesat) e a Auditoria Fiscal do Trabalho divulgaram o resultado do processo de investigação da causa da morte, por suicídio, de um trabalhador da Refinaria Landulpho Alves, na Bahia, ocorrido no dia 22/09/2020, nas dependências da Unidade de Desoleificação a Propano, na refinaria (atual U-13). A inspeção e investigação feitas pelos dois órgãos foram realizadas em atendimento à denúncia formulada pelo Sindipetro Bahia.
Os técnicos e os auditores fiscais do trabalho analisaram as áreas das diversas unidades da refinaria, as atas da Cipa, os documentos que foram solicitados à Petrobrás e ainda coletaram informações com os colegas de trabalho do empregado, que exercia a função de Coordenador Técnico Operacional (CTO), tinha 40 anos de idade, era casado e deixou dois filhos, com oito e dois anos de idade. Eles também conversaram com a esposa e com os chefes do falecido, que trabalhava na estatal há 12 anos. Os dois órgãos ainda se pautaram na análise da literatura correlata e da legislação vigente.
Foi detectado que “um cenário mais amplo de tensões sociais se desencadeava entre os trabalhadores, desde o anúncio da venda da empresa. Esta decisão da Petrobras, segundo aponta a 7a Ata da reunião da Cipa, instalou um clima de insegurança e de mal estar coletivo, entre todos os trabalhadores de alguma forma vinculados a RLAM”.
Houve também “relatos detalhados dos problemas enfrentados na Unidade 13 nos dias que antecederam o óbito e que tinham como contexto uma situação de elevada sobrecarga de trabalho imposta ao CTO, devido à redução do quantitativo gerencial em sua unidade industrial”.
Os relatórios expõem ainda a pressão sofrida pelo trabalhador que acabava por ter uma “responsabilidade hierarquicamente maior que a dos supervisores”, “trabalhando, de forma frequente e habitual, em horários que extrapolavam a jornada de trabalho diária prevista na legislação vigente”. E ainda usava “constantemente um notebook e um celular, ambos corporativos, para comunicação e monitoramento remoto dos processos”.
Chama a atenção também a informação dada pela esposa do falecido que o celular de uso particular do seu marido foi “recolhido pela empresa, sob o argumento de que este seria encaminhado para a perícia técnica”, o que não ocorreu. O notebook de uso do trabalhador também não estava de posse da Polícia Técnica para ser periciado.
De acordo com relatos de colegas, o trabalhador, muito dedicado, já estava sendo citado para ser promovido. Porém, com a reformulação da empresa, outra gerente ocupou o cargo. No entanto, a sua responsabilidade aumentou, sendo dado a ele mais atribuições. O Coordenador Técnico Operacional (CTO) passou a se responsabilizar por duas unidades.
Segundo os relatórios, após entrevistas, ficou claro que o trabalhador falecido “era um operador experiente, tendo se tornado Coordenador Operacional não apenas por deter o conhecimento técnico necessário, mas também por possuir o perfil de liderança, sendo hábil para coordenar a equipe”.
Os colegas que trabalhavam com o falecido, na OP LUB, afirmaram, durante as investigações que “a redução do efetivo mínimo nas áreas operacionais ao longo dos anos, implicou na intensificação do trabalho em várias unidades e no acúmulo de responsabilidades para as equipes que permaneceram”.
Saúde mental por um fio
Ficou claro durante as investigações que o trabalhador falecido não tinha histórico anterior de sofrimento mental. A família informou que o trabalhador vivia estressado e inquieto, “a conversa dele era Petrobras, venda, transferência”. Afirmando ainda que ele “vinha trazendo assuntos técnicos de problemas da Refinaria para momentos de confraternização familiar, bem como demonstrou preocupação com as possíveis mudanças na vida familiar, decorrentes da privatização da empresa”.
Ainda de acordo com os relatórios “a partir de informações fornecidas por trabalhadores do setor, soube-se que a ocorrência de casos de sofrimento mental tem sido comum na empresa. Após o referido suicídio, outro colega de trabalho da Unidade U13, subordinado ao falecido, foi afastado e internado em uma clínica para tratamento, devido a suspeita de transtornos mentais”.
Trabalho e sofrimento psíquico
Ao finalizar as investigações, a conclusão dos técnicos do Cesat e dos auditores fiscais do trabalho foi que “as mudanças no contexto laboral da RLAM /Petrobras tiveram contribuição decisiva para o sofrimento psíquico do trabalhador, seguido de ideação suicida com desfecho fatal”.
Os relatórios deixam claro que “o suicídio decorreu de uma doença mental desencadeada em função das condições em que o trabalho era realizado. A inexistência de ações que pudessem mitigar eventos relacionados ao sofrimento mental, no período, concorreu para o não afastamento do trabalhador da atividade laboral”, que permaneceu em atividade “ainda que com sinais evidentes de um quadro de transtorno mental em curso”.
Considerando o que aponta o documento, os técnicos e auditores afirmaram que “faz-se necessário a implantação de medidas de melhorias da organização do trabalho, das condições de saúde e segurança no trabalho e de adequação do quadro profissional do SESMT, com inclusão de profissional da área de saúde mental, a fim de evitar a ocorrência de novos casos de suicídio no trabalho nas dependências da RLAM”
A Auditoria Fiscal do Trabalho autuou a Rlam, lavrando seis autos de infração. Entre eles, por ter deixado de consignar em registro mecânico, manual ou sistema eletrônico, os horários de entrada e saída e período de repouso efetivamente praticados pelo empregado, por desconsiderar, no planejamento e implantação o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, os riscos à saúde dos trabalhadores e por providenciar a emissão de Atestado de Saúde Ocupacional, sem o conteúdo mínimo previsto na NR-7.
Riscos psicossociais relacionados ao trabalho na RLAM
Os técnicos e auditores apontaram os prováveis riscos psicossociais associados ao trabalho na RLAM: longas jornadas, clima de incertezas pelo contexto de venda da empresa, aumento de responsabilidades com a gestão, pressão por produção, alta carga de responsabilidade na figura do CTO, redução de gratificação no período da pandemia, valorização do alcance de metas com baixa valorização do trabalho, pressões gerenciais por eficiência com menor custo, indefinição quanto ao destino dos trabalhadores, clima de ameaças com visitas de compradores e pouca clareza sobre contexto, monitoramento remoto da planta, continuamente e redução das equipes e sobrecarga dos remanescentes. Em relação ao teletrabalho é visto como risco psicossocial o baixo equilíbrio entre a vida pessoal e trabalho, excesso de trabalho, dificuldade de desconexão, isolamento. No caso específico do trabalhador falecido houve ainda “a falta de reconhecimento por todo o seu esforço e dedicação à empresa e desvalorização do cargo por ele ocupado”.
A partir dos relatórios do Cesat e da Audotria Fiscal do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) abriu procedimento investigatório para apurar o caso e a situação do meio ambiente de trabalho na refinaria, tendo, inclusive, já intimado o Sindipetro Bahia para contribuir no inquérito civil.